Guia do MEI: Pequenos negócios avançam no país e buscam formalização como microempreendedores



 

Há cerca de dois anos, a publicitária e engenheira Fabiana Roseira, 41, transformou em fonte de renda o que era um hobby até perder o emprego: os bolos e doces que produzia para as festas de aniversário dos nove sobrinhos. O negócio cresceu, a carioca passou a ter necessidade de emitir nota fiscal e agora está prestes a sair da informalidade e se tornar uma microempreendedora individual (MEI).

A história de Fabiana não é uma exceção. No ano passado, o número de trabalhadores por conta própria e sem carteira assinada, juntos, superou pela primeira vez o daqueles com emprego formal, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

A recuperação do emprego após a crise econômica vem puxada fortemente pelos profissionais autônomos, os chamados por conta própria. Neste ano, metade das 2 milhões de novas vagas esperadas serão criadas por empreendedores, segundo estudo do Santander.

Em março, dados mais recentes, o país tinha 32,9 milhões de trabalhadores com carteira assinada, o nível mais baixo da série histórica do IBGE. Os trabalhadores por conta própria somavam 22,9 milhões e o sem carteira assinada, 10,7 milhões. Os desempregados somavam 13,7 milhões.

O MEI é, normalmente, a porta de entrada para o empreendedorismo formal. É o regime de tributação mais simples do país, pelo qual é possível manter um CNPJ e ter direito a benefícios como aposentadoria e salário-maternidade pagando até R$ 53,70 por mês. Mas só pode optar por ele quem fatura até R$ 81 mil por ano (ou R$ 6,7 mil por mês) e tem no máximo um funcionário. A inscrição não tem custo algum e pode ser feita online no Portal do Empreendedor.

Mas para quem o MEI é indicado? Quando vale a pena se formalizar? Como é processo? Quanto custa? O G1 preparou uma série de reportagens com o Guia do MEI para esclarecer essas dúvidas ao longo desta semana:

  • 14/5 – Pequenos negócios buscam formalização
  • 15/5 – Passo a passo para virar MEI
  • 16/5 – Quanto custa e quando vale a pena
  • 17/5 – Quais as obrigações do MEI
  • 18/5 – Cresci demais. E agora?
  • 19/5 – MEI vira nicho de negócio

Quantos são MEIs?

Hoje, são 6,7 milhões de MEIs no Brasil. O número chegou a 7,7 milhões no fim de 2017, mas baixou porque, em fevereiro, a Receita Federal cancelou 1,4 milhão de CNPJs por falta de pagamento das obrigações fiscais.

A quantidade de novos registros no MEI cresce a cada ano, assim como a sua participação dentre os negócios abertos, de acordo com levantamento da Serasa Experian. De todas as empresas nascidas em 2012, 59,9% eram MEIs. Em 2017, essa fatia chegou a 78,6%.

“O MEI é a nossa maior política de formalização. Boa parte [desses empresários] eram informais, ambulantes, que trabalhavam sem nenhum respaldo legal e passaram a ter CNPJ, contar com cobertura previdenciária”, diz José Ricardo da Veiga, secretário especial da micro e pequena empresa no Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC).

Mais vendas para quem tem CNPJ

Paula Regina da Silva, 37, prepara e vende sanduíches, bolos e doces nas ruas e no comércio próximos de onde mora, na região de Sapopemba, zona Leste de São Paulo, com a ajuda do filho Sérgio, 17. Desde que se demitiu do restaurante onde trabalhava com carteira assinada, há quatro anos, não fez nenhuma contribuição para a Previdência Social.

O negócio de Paula, a Família Ribeiro Delícias, acaba de virar empresa. Ela aproveitou um evento promovido pelo Sebrae na capital paulista para fazer o seu cadastro como MEI. Decidiu se formalizar porque perdia vendas por não aceitar vale-refeição e vale-alimentação. Ela já tinha uma maquininha de cartão, mas como pessoa física só conseguia liberar transações de crédito e débito.

“O próximo passo é vender bastante e crescer mais”, diz, animada. As vendas, que hoje somam R$ 5 mil por mês, sustentam toda a família de cinco pessoas.

Ter o CNPJ (e poder emitir nota fiscal) também ampliou as oportunidades de negócio da confeiteira Fabiana, que comemora a nova etapa e já sonha com uma empresa maior. “Com a formalização, com os controles [financeiros] e podendo atender outros tipos de clientes, como organizações, buffets, cafeterias, quem sabe a gente vai poder ampliar o nosso negócio e, no futuro, ter um upgrade do MEI?”, diz.

Ter um CNPJ também permite que o microempreendedor compre mercadorias direto de fornecedores e venda para governos, ou seja, participe de licitações públicas.

A florista Eduarda Ribeiro, 37, concorda. Ela, que é formada em audiovisual, se tornou MEI em 2013, depois de trabalhar por dois anos ornamentando eventos sem qualquer registro.

“A partir da formalização eu consegui pegar clientes maiores, dar seriedade maior para o meu trabalho e também focar, a dizer para mim ‘eu não estou trabalhando com isso só porque eu gosto, eu estou trabalhando com isso porque eu quero fazer desse o meu business de verdade'”, conta a dona da Pólen Flores e Plantas.

Quem são os MEIs?

Mais de 500 atividades de prestação de serviço, comércio ou mistas se enquadram no MEI, como cabeleireiro, manicure, motoboy, pedreiro, açougueiro, doceiro. A atuação dos profissionais no país é bastante polarizada. As duas atividades mais relevantes, a venda de roupas e acessórios e os serviços de salão de beleza, correspondem a apenas 8% do total de registros cada, segundo dados disponibilizados pelo Sebrae, filtrados em março.

Na sequência, vêm os serviços de obras de alvenaria (ou pedreiro), com 4% e as lanchonetes (3%) e os minimercados, mercearias e armazéns (3%). Os comerciantes de alimentos preparados para consumo em casa correspondem a 2%, assim como os promotores de vendas, os donos de bares e os eletricistas.

O Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços considera ativos todos os 6,7 milhões de MEIs registrados atualmente, depois do pente-fino realizado em fevereiro. Porém, isso significa apenas que esses microempreendedores fizeram algum pagamento das obrigações nos últimos três anos.

“Se estão desempenhando ou não as atividades deles, é outra coisa. Isso a gente não sabe informar porque o MEI ainda não tem a nota fiscal eletrônica de prestação de serviços”, diz o secretário José Ricardo da Veiga.

Em fevereiro deste ano (dado mais recente) o índice de inadimplência geral dos MEIs ficou em 46,77%, segundo dados da Receita Federal. Foram pagas 3,5 milhões de vias do Documento de Arrecadação do Simples Nacional (DAS) dos 6,58 milhões registrados até então.

Para Veiga, secretário especial da micro e pequena empresa do MDIC, a representatividade dos MEIs deve continuar crescendo ainda que a economia se recupere com maior fôlego e os empregos com carteira assinada voltem a crescer.

“O empreendedorismo é a bola da vez, sobretudo na base da pirâmide econômica, que sãos MEIs e as micro e pequenas empresas”, diz. “O ‘autoemprego’ é uma tendência mundial, um movimento social mais amplo. Aquela relação com a carteira de trabalho cada vez está sendo menos procurada ou desejada pela nova geração”, completa.

 

Autor: Luísa Melo e Daniel Silveira

Fonte: G1